Artigo de Augusto Nunes, publicado originalmente na página do autor, em VEJA.com. Para acessá-lo, clique aqui.
06/06/2011
às 13:30O terceiro mandato de Lula começou no quinto mês do governo Dilma Rousseff. Na última semana de maio, pronto para ensinar à criatura como se resolve uma crise, o criador baixou em Brasília já acusando a oposição em geral e José Serra em particular de terem inventado o milagre da multiplicação do patrimônio. No mesmo dia, depois de conferir ao chefe da Casa Civil o título de Pelé da Economia, ordenou ao PT e pediu ao PMDB que defendessem Antonio Palocci e fossem pacientes com Dilma Rousseff.
No dia seguinte, ordenou a Dilma e Palocci que fossem ainda mais atenciosos com a companheirada e ainda mais perdulários com a base alugada, deu a crise por encerrada e viajou para o exterior. Acumulando as funções de presidente e palestrante, fantasiou-se de estadista e ganhou milhares de dólares da Odebrecht no Panamá, nas Bahamas, em Cuba e na Venezuela. De volta ao Brasil, soube que a crise que deu por resolvida ficara muito mais grave. E combinou outra conversa com Dilma para dizer o que deve ser feito com o companheiro Palocci.
“Temos o retorno da metamorfose ambulante operando com o costumeiro desdém aos princípios”, escreveu o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso no Estadão deste domingo. “Em vez de se preocupar com a veracidade do que transpareceu, acusa irresponsavelmente o PSDB pelo vazamento de informações relativas à evolução patrimonial do principal ministro do governo. E passa a operar a disputa por cargos e troca de votos no Congresso (…). É mais um passo atrás no amadurecimento da sociedade e da política, que volta a se apequenar no jogo rasteiro de chantagens e pressões”.
Sempre que Lula pensa alguma coisa, o Brasil fica menos inteligente, confirmou a crônica de João Ubaldo Ribeiro no Globo deste domingo. Sem consultar o país e sem mexer em lei alguma, ironizou o escritor, Lula fez a reforma política e instituiu o bipresidencialismo. Em vez de um, a República agora tem dois no comando: “É por isso que ela faz tanta questão de ser chamada de presidenta. Presidente é ele, presidenta é ela. Ele não suporta trabalhar. O trabalho todo de despachar, ler, discutir, assinar etc, ela faz. Das jogadas políticas, dos discursos, das viagens, das mensagens na TV, ele cuida. E de mandar sancionar ou vetar o que for necessário, claro. E ainda com a vantagem de ter alguém para levar a culpa”.
Para a dupla, a fórmula é perfeita. Atormentada pela inapetência política, obrigada a exibir dotes de gerente de país que nunca existiram, dramaticamente despreparada para o cargo, o sonho de Dilma é permanecer enfurnada nos palácios. Ela não consegue acreditar que é presidente. Como não quer acreditar que deixou de sê-lo, o palanqueiro itinerante ambulante dá ordens a ministros, protagoniza almoços e jantares com aliados e passeia pelo mundo.
Neste momento, a pedido de Dilma, Lula pensa no que fazer com o dublê de estuprador de sigilo bancário e traficante de influência que o padrinho escolheu para chefiar a Casa Civil da afilhada. Ele toma a decisão, ela executa. A farsa da superexecutiva onisciente não durou um semestre. É improvável que o bipresidencialismo malandro dure mais três anos e meio.
Primeiro, porque a Constituição não admite a existência de um co-presidente, nem de um tutor de presidentes ineptos. Depois, porque o PT quer controlar a companheira como foi controlado por Lula. Terceiro, e sobretudo, porque o velho e insaciável PMDB já deixou claro que não se contenta com estar no governo: faz questão de ser governo. O vice já não é o companheiro José Alencar. É o ambicioso e astuto Michel Temer. A cada movimento do PT, a cada rompante da política desastrada, a turma do Palácio Jaburu engole mais um naco do poder. Eles sabem que o ex-presidente tem força eleitoral, mas não tem poderes legais.
Lula planejou quase tudo para garantir um terceiro mandato com codinome Dilma. Só faltou combinar com o PMDB.