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terça-feira, 31 de maio de 2011

O ministro da Educação e sua curiosa lógica: se "eles foi", por que que "nóis não vai"?

Artigo de Bolívar Lamounier, publicado originalmente na página do autor em EXAME.com. Para acessá-lo clique aqui.


31.05.2011 - 15h21



Sobre as patacoadas a respeito do ensino do português que o Ministério da Educação tem oferecido ao distinto público, o poeta Ferreira Gullar escreveu um texto a meu ver definitivo. Está na Folha de S. Paulo do dia 25 de maio.
Ferreira Gullar não deixa pedra sobre pedra. Demonstra que a leniência quanto ao falar e escrever errado, se não é pura sandice, é uma mal-disfarçada  orientação partidária e ideológica que o MEC está estabelecendo – ou permitindo que se estabeleça – no ensino do idioma.
Num caso ou no outro – aqui quem fala sou eu-, é um motivo suficiente para a presidente Dilma Rousseff  dar início a uma séria reformulação na pasta.
Hoje (31.05), o ministro Fernando Haddad compareceu à Comissão de Educação e Cultura do Senado para discutir o assunto. Fez um enfático pedido para a questão ser tratada “no devido contexto”. O caso ganhou um clamor tão grande – declarou – “…que foi preciso dizer que o livro atende aos PCN [Parâmetros Curriculares Nacionais] que nem são do governo Lula, mas do governo Fernando Henrique”.
A lógica do ministro Haddad merece ser examinada no devido contexto, ou seja, contra o pano de fundo do discurso lulo-petista e das relações do governo Lula com o do presidente Fernando Henrique.
Não é segredo para ninguém que a diretriz “pedagógica” do MEC a respeito do ensino do português  vem recebendo pesadas críticas. Eu, particularmente, considero-a prá lá de equivocada. Para defendê-la, o ministro saca um Colt 45: a referida diretriz nem é do governo Lula, mas do governo Fernando Henrique. Neste caso, o governo FH é sinônimo de pedigree, ou de  indulgência plenária, como queiram.
E as centenas de medidas econômicas e sociais (a começar pelo Plano Real) que o governo FH implementou, que tiraram o país do buraco em que ele se encontrava e deslancharam um importante processo de transformação?
Ah, não. Nesse caso o argumento não se aplica. Lula sabidamente se valeu dos avanços econômicos e copiou as políticas sociais do governo anterior, mas reconhecer que o fez nunca esteve em suas cogitações. Para ele e para o todo o petismo, o legado de FH sempre foi algo a exorcizar: uma “herança maldita”.

Bolívar Lamounier
O sociólogo e cientista político Bolívar Lamounier, sócio-diretor da Augurium Consultoria, é autor de alguns dos mais conhecidos estudos de ciência política no país. Seu livro mais recente, A Classe Média Brasileira: ambições, valores e projetos de sociedade, escrito com Amaury de Souza, foi lançado este ano pela Editora Campus.